Autor: Editoria de Folclore - Site de Dicas[1]
Conteúdo Atualizado: 28 de Novembro de 2023
No princípio, o personagem era masculino e chamava-se Ipupiara, homem peixe que devorava pescadores, e os levava para o fundo do rio. No século XVIII, Ipupiara se torna a sedutora sereia Uiara ou Iara. Todo pescador brasileiro, de água doce ou salgada, conta histórias de moços que cederam aos encantos da bela Uiara e terminaram afogados de paixão.
Ela deixa sua casa no fundo das águas no fim da tarde. Surge magnífica à flor das àguas: metade mulher, metade peixe; cabelos longos enfeitados com flores vermelhas. Por vezes, assume a forma humana, e sai em busca de vítimas.
Quando a Mãe das Águas canta, hipnotiza os pescadores. Um deles foi o índio Tapuia. Certa vez, pescando, Ele viu a deusa, linda, surgir das águas. Resistiu. Não saiu da canoa, remou rápido até a margem e foi se esconder na aldeia.
Mas, enfeitiçado pelos olhos e ouvidos, não conseguia esquecer a voz de Uiara. Numa tarde, morto de saudade, fugiu da aldeia e remou na sua canoa rio abaixo.
Uiara já o esperava cantando a música das núpcias. Tapuia se jogou no rio e sumiu num mergulho, carregado pelas mãos da noiva. Uns dizem que naquela noite houve festa no chão das águas, e que foram felizes para sempre. Outros dizem que na semana seguinte a insaciável Uiara voltou para levar outra vítima.
Este é um Mito baseado no modelo das sereias dos contos Gregos. A Iara é uma ninfa loura de corpo deslumbrante e de beleza irresistível. Sua voz é melodiosa e seu canto, tal como no original grego, é capaz de enfeitiçar a todos que o ouvem, arrastando-os em sua direção, até o fundo do rio, lagos, igarapés, águas, onde vivem estes seres fabulosos.
Na Amazônia, a Mãe-dágua atrai os moços sob forma de uma moça bonita, e às moças, aparecendo-lhes sob o aspecto de um belo e sedutor moço. As crianças também são vítimas, e após desaparecem misteriosamente, creem os ribeirinhos que essas crianças ficam "encantadas" no reino da "gente do fundo".
Lá o menino é instruído no preparo de todos os tipos de remédios. Passados sete anos, durante os quais foi iniciado nas artes mágicas e na manipulação de plantas e ervas, o jovem pode retornar para junto dos seus, onde, geralmente, se torna um grande curandeiro.
A Iara (ig-água, iara-senhor) é uma roupagem de cultura européia. Não há lenda indígena que tenha registrado a Iara de cabelos longos ou voz maviosa.
As lendas indígenas mais velhas, citam sempre o Velho Homem Marinho, o Ipupiara, nunca a Iara. Além do Ipupiara, o índio brasileiro tem outra tradição assombrosa das águas. É a Cobra Grande, a Cobra Negra ou Boiúna[2].
Nomes comuns: Ipupiara, Hipupiara(demônio dágua), Uiara, Uauiará, Iara, Eiara, Oiara, Mãe-dágua, Hirã, etc.
Origem Provável: É oriundo da Mitologia Grega. Os portugueses, homens do mar, possuíam a tradição das lendas marítimas, de Tritões, Sereias e animais fabulosos. As Sereias constituíam um patrimônio comum aos povos navegadores. Havia a Sereia dos gregos e dos romanos. Mas esta era um pássaro, e não um peixe.
Nenhum autor clássico fala de Sereias em forma de peixe. Na versão oficial eram moças, sentadas na areia da praia, que ali ficavam a cantar. Na África havia Haraké, que atraia os homens para as águas do Níger.
Da forma como ela atualmente existe, nenhum índio, entre os séculos XVI e XVII a conheceu. A Iara, mulher tentadora, é uma lenda totalmente estranha à mítica indígena. O Ipupiara dos cronistas coloniais, o verdadeiro mito dos índios, não possuía os encantos sedutores da atual Iara. Antes disso, era um Homem-peixe, feroz, bestial, saindo da água para matar, sempre matar. Não há um só aspecto simpático no Ipupiara monstro marinho. É horrendo, esfomeado e apavorante.
De acordo com os cronistas, não aparece no Ipupiara o poder de transformar-se em homem ou mulher. De comum com a Sereia atlântica, e mediterrânea só existe o elemento água, ambiente onde vive.
A Iara (Ig-água, Iara-Senhor) é uma roupagem de cultura européia. Não há lenda entre os índios que tenha registrado a Iara de cabelos longos e voz encantadora. As lendas indígenas mais antigas citam sempre o Velho Homem Marinho, e não a Iara. A presença da Iara indica claramente a força da presença dos mitos dos brancos colonizadores ou a influência assimiladora do mestiço, que a tudo absorvia que vinha de fora, como se fora uma esponja.
Como existe atualmente, não se viu um só índio nos séculos XVI e XVII que a tivesse conhecido. Além do Ipupiara, o índio brasileiro tem outra grande tradição assombrosa de monstro aquático. É o ciclo da Cobra Grande, a Cobra Negra, a Boiúna[2], das mil estórias amazônicas.
Há em Portugal um mito semelhante ao da Iara que se chama Hirã[3]. Ela é descrita como uma mulher de cabeça muito volumosa e com um corpo franzino, a qual, em chegando à idade de 12 anos, se transforma em Serpente e vai viver no Mar. A Hirã, é a última das sete irmãs que nasceram de forma consecutiva.
Ainda, segundo os pesquisadores, o mito da Cobra Grande foi, evidentemente, fundido com o da Mãe Dágua. Há o depoimento do Padre Figuerôa[4], afirmativo e claro. Mas em nenhum velho documento encontra-se qualquer menção de que a Cobra Grande deixe sua forma original para se transformar em outra coisa, como homem ou mulher. Nenhuma lenda tradicional dos índios brasileiros narra a Cobra Grande parecendo com a Mãe-Dágua.
[2] Este mito tem sua própria biografia. Veja também A Lenda Cobra Grande ou Cobra Norato
[3]
J. Leite de Vasconcelos - Tradições Populares de Portugal, p. 287. Porto, 1882.
Outro historiador português, o Teófilo Braga, em O Povo Português nos seus costumes, crenças e tradições, Vol. I, pp. 181-182, Lisboa, 1885, registra igualmente a Hirã. "Na ilha de São Tiago, do arquipélago de Cabo Verde, crê-se na entidade Hirã, que é sempre a última das sete filhas nascidas consecutivamente; tem corpo franzino e cabeça grande, e ao fim de doze anos transforma-se em Serpente e vai viver no Mar. As tribos da Guiné adoram a Hirã em um templo que se chama Baloba."
[4] Há documentos que atestam, que em 1630, era corrente chamar-se uma cobra de "Mãe Dágua", e no caso dos Mainas do alto Maranhão onde o Padre Figuerôa missionou, seria a esposa do deus Inerre.
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