Autor: Editoria de Folclore - Site de Dicas[1]
Revisto e Atualizado: 02 de Maio de 2024
Era um Bicho que deixava, a partir da descrição feita pelas mães ou cuidadoras, qualquer menino arrepiado só de ouvir falar. Soltava fogo e fumaça pelos olhos, nariz e boca. Atacava quem andasse pelas ruas desertas nas noites de sexta. Mas, o pior era que a Cabriola[2] entrava nas casas pelo telhado ou porta, à procura de crianças malcriadas ou travessas, e com sua voz rouca e do outro mundo, quando ia chegando, cantava um refrão mais ou menos assim:
"Eu sou a Cabra Cabriola,
Que como meninos aos pares,
Também comerei a vós,
Uns carochinhos de nada..."
As crianças não podiam sair de perto das mães, sempre que escutavam qualquer ruído estranho perto da casa. Podia ser qualquer outro bicho, ou então a temível Cabriola, assim era bom não arriscar. Astuta como uma Raposa e fétida como um bode, assim era descrita essa criatura.
Em casa de menino obediente, bom para a mãe, que não mijasse na cama e não fosse travesso, a Cabra Cabriola não passava nem perto.
Quando no silêncio da noite, alguma criança chorava, diziam que a Cabriola estava devorando algum malcriado. O melhor nessa hora, era rezar o Padre Nosso e fazer o Sinal da Cruz.
Considerada mais temida que o Lobisomem e a Mula-sem-Cabeça, que são mitos vindos de fora há muito mais tempo, a Cabra Cabriola, logo se tornaria o consolo das mães, já que não precisavam se esforçar muito para obrigar seus filhos, logo cedo e sem pirraças, a tomar o rumo da cama. Para os pequenos, aquela criatura era sem dúvida o seu maior pesadelo.
São muitos e faz parte da tradição regular, os contos populares em que figura a Cabra Cabriola em ação. Os testemunhos de época logo se tornavam preciosos reforços para cada mãe colocar na linha seus filhos travessos ou malcriados.
Nomes comuns: Cabra Cabriola, Cabriola, Papão de Meninos, Bicho Papão, etc.
Origem Provável: O mito do Bicho papão que ataca as crianças travessas é bem antigo e remonta ao tempo da Idade Média na Europa. É uma assombração portuguesa que acabou se incorporando ao nosso fabulário.
E na América Central, há também o Gulén-Gulén-Bo, um personagem que fortuitamente assusta e come as crianças mal comportadas, e tem as mesmas características da nossa Cabriola.
No Brasil, deriva-se de um mito afro-brasileiro, onde acreditava-se tratar-se de um duende maligno que tomava a forma de uma Cabra. Costumava atacar as mães quando estavam amamentando. E nessa ocasião, bebiam seu leite direto nos seus seios, e depois devoravam as crianças. Além de Pernambuco, há versões deste mito nos estados do Ceará, Bahia, Alagoas, Sergipe e Pará.
A figura da Cabra Cabriola, também é mencionada na Espanha e Portugal.
Acredita-se que chegou ao Brasil durante o período da colonização portuguesa.
Havia uma mulher que tinha três filhos de tenra idade, e saindo sempre à noite para angariar meios de subsistência para eles, recomendava-lhes muito insistentemente, que se prevenissem contras as astúcias da Cabra Cabriola, não abrindo a porta senão a ela própria, cuja voz e toada e particular, perfeitamente conheciam.
Certa noite, porém, chegado o monstro, bate à porta, e ignorando o acordo estabelecido, pede como se fosse a mãe das crianças, que a deixem entrar. No entanto, como fez isso falando naturalmente com a sua voz forte, grossa e horrível, nada conseguiu das suas artimanhas, e saiu desesperada bramindo:
"Eu sou a Cabra Cabriola,
Que come meninos aos pares,
E também comerei a vós,
Uns carochinhos de nada...".
Retrocede depois, oculta-se, e aguarda a volta da mulher, e com semelhante artifício aprende-lhe a toada, e repara bem no seu timbre de voz.
No dia seguinte vai à casa de um ferreiro, manda bater a língua da bigorna, e conseguindo assim modificar a sua voz tornando-a mesmo igual à da mãe dos meninos, vem à noite, espreita a sua saída e depois, bate à porta cantarolando a conhecida toada:
"Filhinhos, filhinhos
Abri-me a porta,
Qu´eu sou vossa mãe;
Trago lenha nas costas,
Sal na moleira,
Fogo nos olhos,
Água na boca,
E leite nos peitos
Para vos criar..."
E as pobres crianças, na crença de que era a sua própria mãe que assim lhes falava, abrem apressadamente e com alegria a porta, e inesperadamente se deparam com a esfaimada Cabra Cabriola, que as leva consigo.
[2] Pereira da Costa recolheu a estória da Cabra Cabriola no seu Folclore Pernambucano (pp. 80/81. Revista do Instituto Histórico Brasileiro, tomo LXX, Parte II. Rio de Janeiro, 1908).
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