Autor: Editoria de Folclore - Site de Dicas[1]
Revisto e Atualizado: 02 de Janeiro de 2025
No entanto, é quase consenso que se trata de uma criança, um negrinho de uma perna só, que fuma um cachimbo e usa na cabeça uma carapuça vermelha[2] que lhe dá poderes mágicos, como o de desaparecer e aparecer onde quiser. De acordo com a tradição, existem 3 tipos de Sacis: O Pererê, que é pretinho; O Trique, moreno e brincalhão, e o Saçurá, que tem olhos vermelhos, como tochas de fogo.
Ele também tem a capacidade de se transformar numa ave chamada Mati-taperê, ou Sem-fim, ou ainda Peitica, como é conhecida no Nordeste dop Brasil, cujo canto melancólico ecoa em todas as direções, não permitindo sua localização. Este pássaro, é o mesmo que deu origem ao mito da Matinta-Pereira.
A superstição popular faz desta ave uma espécie de demônio que pratica malefícios pelas estradas, enganando os viajantes com os timbres dispersos do seu canto, fazendo-os perder o rumo, e não conseguindo mais achar o caminho de volta para casa.
O Saci é a Mati-taperê, a mesma Matinta-Pereira, dos Paraenses e Barés. Os índios Mundurucus tinham a Matinta como a visita de seus antepassados, uma espécie de retorno das almas. A Matinta, era, como a Acauã, o Beija-flor, ou o Babacu, portadores dos espíritos dos mortos. A Matinta atual é o corpo que abriga o espírito de um ser vivo.
Por encantamento, alguém pode se transformar em Matinta e voar durante a noite assustando quem encontra pela frente. Pela madrugada, volta à forma humana. A Matinta dos Mundurucus não era assim. O mesmo ocorre com o Saci. Saci é Saci a vida inteira. Ninguém pode se tornar um Saci e andar pedindo fumo à noite pelas estradas, ou às portas das casas.
Teodoro Sampaio,[3] ensinava que era assim o Saci:
Ele adora fazer pequenas travessuras, como esconder brinquedos, soltar animais dos currais, derramar sal nas cozinhas, fazer tranças nas crinas dos cavalos, e assim por diante. Diz a crença popular, que dentro de todo redemoinho de vento existe um Saci. Dizem que ele não atravessa córregos nem riachos, pois tem medo de água. Diz ainda o Mito, que se alguém jogar dentro do redemoinho um rosário de mato bento ou uma peneira, pode capturá-lo, e caso consiga pegar sua carapuça[4], poderá ter um desejo seu concretizado.
Alguém perseguido pelo Saci, deve jogar em seu caminho, cordas ou barbantes com nós. Ele então irá parar para desatá-los, e só depois continua a perseguição. Isso dará tempo para que a vítima possa escapar. Aqui, percebe-se a influência do Mito da Bruxa Européia, que também é obrigada a contar os fios de um feixe de fibras, ou novelo de linha, antes de entrar nas casas.
Do Amazonas ao Rio Grande do sul, o mito sofre variações. No Rio Grande do Sul, ele é um menino de uma perna só, que adora atormentar os viajantes noturnos, fazendo-os perder o caminho. Em São Paulo, é um negrinho que usa um boné vermelho e frequenta os brejos assustando os cavaleiros. Se ele reconhece a pessoa, irá chamar pelo seu nome, e então foge dando uma espetacular gargalhada.
Nomes comuns: Saci-Cererê, Saci-Trique, Saçurá, Mati-taperê, Matiaperê, Matimpererê, Matintaperera, Capetinha da Mão Furada, etc.
Origem Provável: Os primeiros relatos são da Região Sudeste, em Minas e São Paulo, datando do Século XIX. Em Portugal, há relatos de uma entidade semelhante, que usa botas vermelhas. Há também variantes do mito, na Argentina, Uruguai e Paraguai, onde passa a se chamar (Yasy Yateré), e é pequeno e gordo, de pele vermelha, e usa um bastão mágico dourado. Na Alemanha, existe um anão chamado Kobolde, igual em quase tudo ao nosso Saci. Nos Estados Unidos, há também o Gremlin, que é outra entidade com as mesmas características do nosso personagem, embora fisicamente tenha outra aparência.
Entretanto, Nenhum dos cronistas do Brasil colonial registrou o Saci como é conhecido no Sul do país. Assim como, nenhum deles o inclui como uma das curiosidades da terra recentemente descoberta. Entre os Tupinambás, uma ave chamada Matintaperera, com o tempo, passou a se chamar Saci-pererê, e deixou de ser ave para se tornar um caboclinho preto de uma só perna, que aparecia aos viajantes perdidos nas matas.
Por exemplo, as mãos furadas no centro, se deve ao fato de que sua maior diversão é jogar uma brasa para o alto, para que esta atravesse os furos. Pode fazer o mesmo com uma moeda. Dizem que ele não suporta o alho. Em outros lugares, ele pode aumentar ou diminuir de tamanho à vontade. Há também uma versão na qual, o Caipora ou Curupira é o seu Pai.
Não há o Saci-Pererê no Norte nem no Nordeste. É citado com frequencia no folclore do sul brasileiro, tendo tradições vivas e similares em todos os países que circundam o Brasil, especialmente nas regiões antes povoadas pelos Tupi-Guaranis, de cujo idioma nasce seu nome. Coincide sua jornada sul-norte com o roteiro das migrações tupis, pois acredita-se que esta raça é a responsável pela introdução deste mito no Brasil.
Não há o Saci nas crônicas do Brasil-colonial, o que seria um fato injustificável caso sua influência fosse semelhante à do Curupira, Hipupiaras, Anhangas, Juruparis, Caaporas etc. Deduz-se então, que o mito não estava popularizado nos primeiros séculos da nossa colonização.
O Saci aparece em fins do século XVIII, e tem sua vida desenvolvida durante o século XIX. Surge há uns duzentos anos atrás, vindo do sul, pelo Paraguai-Paraná, justamente a zona indicada como tendo sido o centro de dispersão dos Tupi-Guaranis.
Ao subir para o Norte, o Saci foi assimilando os elementos que pertenciam ao Curupira, ao Caapora, e confundindo-se com a Mati-taperê. Com este último, o Saci, que já era um mito ornitológico e local, uma ave singular, em torno da qual giravam episódios e fábulas misteriosas, teve impulso maior.
Do Curupira, herdou a mania de interromper a carreira para desmanchar nós e tecidos atirados pelo perseguido. Alguns demônios europeus, como os de Portugal, por exemplo, têm a obrigação de contar os grãos de paínço atirado sob as pontes. Também herdou o Saci, o direito de desnortear o viajante, fazendo-o perder-se na floresta, antigo privilégio apenas do Curupira. Nas repúblicas do Prata, o Saci continua a ter cabelos vermelhos, semelhante ao Curupira Brasileiro.
Do Caapora, tornado Caipora, dá o assobio, surra os cães, atrasa negócios, pede fumo e pode proteger aqueles com quem simpatiza. Aprendeu a montar, fazendo rédeas das crinas dos cavalos e cansando os animais.
Normalmente é descrito como sendo, negrinho, lustroso, sem pelos no corpo nem na cabeça. Têm dois olhos vivos e vermelhos. Sua altura não passa de meio metro, pula com grande agilidade numa só perna e possui dentes brilhantes e brancos. Orelhas como de morcego, carapuça vermelha[5]. Quando vê gente assobia. Adora assobiar de surpresa nos ouvidos dos viajantes, deixando-os desorientados pelo susto.
Dizem também que ele, na verdade eles, um bando de Sacis, costumam se reunir à noite para planejar as travessuras que irão fazer. Ele ainda tem o poder de se transformar no que quizer. Assim, vezes aparece acompanhado de uma horrível megera, vezes sozinho. Outras vezes como uma ave. Para os Paraenses, o Saci é a Mati-taperê, ou Matinta-Pereira. Em 1875, entre os índios Munducurus, já existia esta tradição.
O mais comum é que o Saci seja relatado apenas como brincalhão e malicioso, mas nunca malvado. Tanto, que são notórias suas gargalhadas à cada travessura que pratica.
A carapuça inseparável do Saci é encantada, e se lhe arrebatam, ele dará fortunas para a recuperar. Em Portugal, há o Pesadelo. Esta entidade é o Diabo que vem com uma carapuça e com uma mão pesada, que põe sobre o peito daquele que dorme de barriga pra cima, não deixando-o gritar ou mover-se. Quem for capaz de lhe tirar a carapuça da cabeça, ele fugirá pelo telhado e dará uma fortuna para tê-la de volta.
No Norte do país, o fabulário local substitui o Saci por outro. O pesquisador Barbosa Rodrigues,[6] assim escreve:
"...No Sul é Saci tapereré, no Centro Caipora e no Norte Maty-taperê.
O civilizado, que muitas vezes não entende a pronúncia do sertanejo, que é o mais perseguido por ele nas suas viagens, tem-lhe alterado o nome; já o fez Saci-pererê, Saperê, Sererê, Siriri, Matim-taperê, e até lhe deu um nome português, o de Matinta-Pereira, que mais tarde, talvez, terá o sobrenome "da Silva" ou "da Mata".
Para alcançar seus objetivos e fazer suas proezas sem ser visto, quase sempre vive o Saci ou Mati, metamorfoseado em pássaro, que se denuncia pelo canto, cujas notas melancólicas, ora graves ora agudas, iludem o caminhante que assim fica incapaz de localizá-lo. Isso porque, as notas graves parecem indicar que o Saci está por perto, enquanto que, as agudas, indicam claramente que ele está distante. E assim, iludido pelo canto disperso, acaba se perdendo e nunca encontrando o tal pássaro."
O pesquisador ainda nos ensina que o mito do Saci se confundiu com tantos outros, especialmente em volta das aves de canto disperso ou, como esse pássaro que tem o hábito de pousar numa só perna, dando a impressão de ser unípede. O Saci quando tornado mito com forma humana terá apenas uma perna.
"Poder-se-á dizer que, a ave ou aves que determinaram o mito da Matinta, são as responsáveis pelo Saci atormentador. O mito é, pelo que me parece, inicial e unicamente ornitológico...", completa ele.
Saci - Casta de pequena coruja, que deve o nome ao grito que faz ouvir repetidamente durante a noite. É pássaro agourante. Contam que é a alma de um pajé, que não satisfeito de fazer mal quando deste mundo, mudado em coruja, vai à noite agourando aos que lhe caem em desagrado, e anuncia desgraças a quantos o ouvem.
O nome de Saci é espalhado do Amazonas ao Rio Grande do Sul. O mito, porém, já não é o mesmo. No Rio Grande, é um menino de uma perna só que se diverte em atormentar à noite os viajantes, procurando fazer-lhes perder o caminho. Em São Paulo, é um negrinho que traz um boné vermelho à cabeça e frequenta os brejos, divertindo-se em fazer aos cavaleiros que por aí andam toda sorte de diabruras, até que reconhecendo-o o cavaleiro não o enxota, chamando-o pelo nome, porque então foge dando uma grande gargalhada. (Stradelli - Vocabulário Nheengatu-português).
Um Tuixaua tinha dois filhos e vivia feliz com eles. O tio que odiava os sobrinhos, convidou-os para ajudá-lo numa derrubada de árvores para fazer plantio. Os dois sobrinhos aceitaram. Chegados na floresta, o tio embriagou os dois rapazes e matou-os. Depois, um dos assassinados perguntou ao outro:
"O que foi que sonhaste?"
"Sonhei", diz o segundo, "que nós nos lavávamos com carajuru."
"O mesmo sonhei eu..."
E voltaram para a casa da avó. Vendo-os, a velha ia aquecer o jantar, mas os dois disseram: "Ah! minha avó, nós não somos mais gente, e sim só o espírito. Assim seja, minha avó, nós te deixamos, e quando ouvires cantar "Tincuam! Tincuam!" foge para casa, e quando cantarmos "Ti... ti.. ti" então reconhecerás."
A cor vermelha que os netos tinham nos olhos era o sangue.
Ficaram, desde então, mudados em dois pássaros de agouro, de mistério e morte. Um é o Uira-Pajé, Alma de Caboclo, o Sem-Fim, o Saci. O outro é a Mati-taperé. Ambos, nascidos numa tragédia, espalham desgraças e semeiam pavores.
O carajuru é um cipó de cujas folhas se extrai um pó vermelho-vivo que os indígenas empregam na pintura de tecidos, uso de remédios, e especialmente na "pajelança", feitura de puçangas, etc.
O Empregado da casa, que dormia num jirau, embaixo do sobrado, num cômodo térreo em cujo centro acendia fogo todas as noites, contava que certa noite acordara, violentamente agitado por um assobio estridente, como nunca vira, que lhe entrara pelo ouvido direito e saíra pelo esquerdo. Assentou-se na cama. O braseiro estava ainda muito vivo, dando relativa claridade ao aposento. Nada viu, mas o tropel dos animais em torno do curral, denunciava qualquer coisa de anormal.
Dispunha-se a levantar para ver se algum ladrão tentava uma sortida, quando a porta se abriu e o Saci entrou: era um moleque retinto, simpático, de lábios muito vermelhos e calças arregaçadas, e foi logo assentando-se no chão, ao pé do fogo. Pegou de uma brasa e começou a brincar com ela, atirando-a de uma mão para outra mão. Como se sabe, o Saci tem a mão furada e quando a brasa acertava no furo, caindo no chão, ele dava uma gargalhada e olhava para seu vizinho, encolhido na cama, duro de medo. O homem suava e não podia gritar porque a língua estava pregada. Afinal, num esforço supremo, ergueu-se e começou a a fazer o "Creio em Deus Padre" em Cruz (Credo). O Saci ergueu-se, fitou-o dessa vez muito sério, deu um novo assobio ainda mais forte e desapareceu. (pp. 56/57).
1. O Saci é um tipo pequeno, preto, lustroso e brilhante como o pixe; não tem pelo no corpo nem à cabeça: dois olhinhos vivos como os da cobra e vermelhos como os de um rato branco; a sua altura não passa de meio metro; possui dois braços curtos e carrega uma só perna. Com esta pula que nem cutia e corre que nem veado. O nariz boca e dentes igualam-se aos dos pretos americanos (p. 40).
2. ...Se encontra na estrada algum viajante tresnoitado, ai dele! Desfere-lhe de improviso um assobio no ouvido, escarrancha-se-lhe à garupa, e é uma tragédia inteira o resto da viagem. Não raro o mísero perde os sentidos e cai à beira do barranco até dia alto. Outras vezes, diverte-se o Saci com pregar-lhe peças menores; desafivela um loro, desmancha o freio, escorrega o pelego, derruba-lhe o chapéu e faz mil picuinhas de brejeiro (p. 73).
3. Ele vira também o Saci empoleirado no cavalo em carreira louca pelo pasto, em noite de sexta-feira, ou trepado ao telhado da casinha do caboclo transido de medo, assobiando "molequemente" e divertindo-se em quebrar as telhas. (p. 78)
4. Quando ria, saía-lhe fogo pelas narinas (p. 81).
5. ... vulto de um menor de 12 anos, mas sem uma das pernas, magrito, vivo, ativo, buliçoso, caviloso, sem orelhas e trazendo um só olho em pleno frontal (p. 92).
6. ... ele foi sempre incapaz de uma perversidade de consequencias funestas. Limitou-se exclusivamente a afligir os velhos escravos e escravas; assustar os crioulinhos; a afrontar os cavalos de estima, a desarranjar os monjolos, moinhos, engenhos, etc. A carapuça do Saci tem uma importância capital. Quem lhe deu foi o Eterno. Graças a ela, o terrível traquinas torna-se invisível aos olhos do Diabo(p. 97).
7. Contava-se que todas as sextas-feiras, à meia noite, o Saci ia ao baile, debaixo da figueira; e então, arrancava as penas dos galos e galinhas para se enfeitar. Era por demais perigoso, passar alguém, em tal noite, por perto de uma figueira; lá estava o raio do Saci, de carapuça vermelha e todo enfeitado, a dançar e a cantar. E quem ousasse surpreender o Saci nos seus folguedos, perderia a fala e ficaria bobo (p. 120).
8. ... vimos um vultinho preto, pretíssimo, com uma só perna, lábios e olhos vermelhos e com um barretinho (gorro) da mesma cor na cabeça. Era o Saci. Estridentes e repetidos assobios sibilavam aos nossos ouvidos. Entretanto o Saci não parava. Do leito da estrada subia aos lombos dos bois; de 2 a 3 palmos de altura elevava-se a 2, 3 metros, para voltar de novo a ínfima altura. E isso nos acompanhou até a porta do sítio (p. 166).
[2] Acredita-se que a carapuça vermelha do Saci, tenha origem nas carapuças dos marujos de Portugal no século do descobrimento. Em 1560 os Tupinambás recebiam dos visitantes, para por em suas cabeças, estes barretes vermelhos.
[3] Teodoro Sampaio, Tupi na Geografia Nacional, 3a. edicção, Bahia, 1928.
[4] Em Roma, certos fantasmas usavam essa carapuça, e quem a arrebatava teria riquezas. Também o Pesadelo de Portugal possui uma carapuça igualmente encantada.
[5]
A Carapuça Vermelha do Saci é a explicação dos poderes sobrenaturais. A Carapuça que torna seu portador invisível é tema universal. Ver P. Saintyves, Les contes de Perrault et les récits parallèles, Paris, 1923, pp. 284, 289, 291 etc.
O costume de amarrar o Saci para que ele descubra objetos perdidos, ou dê riquezas é velho e clássico. No Brasil é crença corrente entre o povo o ato de amarrar Santo Antônio para fins semelhantes, assim como para casar as mocinhas ou velhas sem pretendentes. Em Portugal de onde nos veio este hábito, ainda prendem o próprio Diabo. (Teófilo Braga - O Povo Português, etc., Vol. II, p. 191.)
[6] Um dos principais nomes na história da botânica brasileira, João Barbosa Rodrigues (1842-1909) produziu também importantes contribuições para o conhecimento de línguas e culturas indígenas da Amazônia.
No clássico *Poranduba Amazonense* (1890), Barbosa Rodrigues publica uma coletânea de lendas e canções em Nheengatu (ou Língua Geral Amazônica), com tradução interlinear
ao português, seguida de tradução livre.
[7] São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, etc. - Notas do volume O Saci-Pererê, Resultados de um Inquérito, São Paulo, 1917.
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