Autor: Alberto Grimm[1]
Publicado: 15 de Agosto de 2024
Embora eufóricos e transbordando de contentamento, um grande, extraordinário e inquietante drama, considerado por eles como um convidado indesejado, mesmo contra a vontade de todos, também adentrara naquele recinto.
O caso é que aquela equipe de competentes engenheiros acabara de conceber um produto revolucionário, mas, de braços dados com tão notável criação, também viera um enorme problema: Aquele produto não tinha utilidade nenhuma, ou seja, não servia para nada. Pelo menos nada que pudessem, naquele momento, vislumbrar. Motivo pelo qual, o departamento de ideias foi imeditamente chamado para ver se encontrava alguma utilidade para o objeto recém criado.
E após muitas reuniões seguidas de intermináveis debates, uma coisa ficou mais que constatada: De fato, aquele objeto não servia mesmo para nada...
“Isso não pode estar acontecendo. É um produto bonito, perfeito em formato e tamanho. Vejam que beleza de design, o estilo impecável, a exuberante elegância, e não serve para nada!”, exclamou desolado o Chefe de Desenvolvimento.
“Já sei”, disse outro, “o departamento de Publicidade pode nos ajudar a encontrar uma solução. Eles são criativos, e certamente vão achar uma utilidade para isso.”
Com a concordância de todos, Foram imediatamente consultar o departamento de Publicidade, cuja resposta foi simples e enfática: “Pode trazer para examinarmos. Fabricar pode não ser um problema nosso, mas vender qualquer coisa, isto, certamente é!”
Contente com a possibilidade, a comissão de cientistas ainda duvidou: “Olha que isso não é qualquer coisa; pode ser um desafio até para vocês...”
O chefe da Publicidade, sorriu e disse: “Somos movidos a desafios!”, e em seguida, lembrou do famoso caso do aparelho de barbear a laser, capaz de remover de vez, e de maneira permanente, os pelos de qualquer pessoa.
Naquela ocasião, o problema fora que, sem pelos, não haveria mais a necessidade do usuário comprar o aparelho, o que o tornaria um objeto descartável, feito para ser usado uma vez apenas, constituindo um grande problema para a empresa. Mas bastou uma abordagem inteligente, um ajustezinho conceitual, e foi um sucesso de vendas, que durava até os dias atuais, agora em sua versão 230 Platinum.
E eles trouxeram o novo e revolucionário invento, e o chefe do departamento de Publicidade, foi logo perguntando: “O que ele faz?”
“Nada, ele não faz absolutamente nada!”, disse o cientista chefe.
Os publicitários se entreolharam por um instante, e depois de cada um examinar pessoalmente o pequeno acessório, comentaram: “É bonitinho, estética perfeita, fácil de carregar e manusear... Mas não faz nada... quer dizer, não serve para nada mesmo?”
“Não, para nada!”, foi o coro unânime dos cientistas.
“Mas, se não serve para nada, por que foi criado?”
Aquela, sem dúvida, era uma pergunta interessante, uma vez que nenhum dos pesquisadores ali presente era capaz de respondê-la de maneira convincente.
Mas, um deles quebrou o silêncio e disse: “Foi criado, porque ninguém jamais havia criado antes um utilitário absolutamente sem função nenhuma...”
O chefe dos publicitários sorriu e disse: “Vai ser um grande sucesso de vendas!”
Os inventores se entreolharam entre si, e meio que tomados de surpresa, não conseguiam acreditar naquilo que acabavam de ouvir.
Pensavam com seus botões: “Como uma coisa que não serve para absolutamente nada, pode se tornar um sucesso de vendas?” E morrendo de curiosidade, Perguntaram: “Estamos tão curiosos que gostaríamos de acompanhar a elaboração da campanha; Podemos?”
“Claro que sim”, respondeu o publicitário, “afinal de contas, vamos precisar de mais informações técnicas sobre esta pequena maravilha capaz de não fazer nada; de não servir para absolutamente nada!”
A grande serenidade e confiança do chefe da publicidade contagiou a todos. E no dia e hora marcada para início dos trabalhos, o inventor chefe foi pessoalmente explicar sua criação à equipe publicitária. E ele disse:
“Como podem ver, é um aparelho pequeno, leve, fininho como um cartão de crédito, o que permite guardá-lo com facilidade em qualquer lugar. Mais ainda; é todo revestido de titânio prensado, última palavra em materiais duráveis. Assim, tem um tempo de vida útil estimado em 300 anos. É a prova de água, de fogo, de choques e de quedas, uma vez que não tem nada dentro, e, portanto, nada que possa ser danificado. E ainda tem mais, por ser impossível de quebrar, além de possuir uma garantia perpétua, também não usa baterias...”
“Mas, é uma grande descoberta de nossa equipe de inventores, especialmente a cor, que é uma cor inexistente...” E antes que fosse capaz de concluir sua explicação, o chefe dos redatores se antecipou e disse com grande confiança:
“É por isso que será um sucesso! E como se não bastasse a garantia perpétua, ele ainda não precisa de baterias... é simplesmente perfeito!”
E então ele explicou como fariam a abordagem, ou plano de marketing.
“Vamos convencer as pessoas das vantagens de possuir um objeto que não serve para nada. Num mundo onde tudo tem uma utilidade, mesmo que não seja uma necessidade, este produto se destaca por não servir para absolutamente nada. Trata-se de algo, portanto, que ninguém ainda possui; um item diferente de tudo. Todos desejarão ter um. Depois convenceremos a todos de que possuir dois é melhor que um, para um caso de eventual perda acidental. Vamos enfatizar na campanha, que tal objeto é uma revolução na conduta do homem deste novo século. Um homem que já possui tudo, e que agora demonstra seu poder de transformação e desapego ao não desejar nada, pois é exatamente isso que lhe proporcionará este maravilhoso objeto, nada!”
Foi um espetacular sucesso, campanha, produto e as vendas. E aquela indústria precisou mesmo criar novas linhas de montagem apenas para atender aos pedidos que não paravam de chegar. Novos modelos foram lançados, novas cores inexistentes ou até existentes para atender as preferências de alguns grupos, e todos com a mesma característica e conceito que ajudou a torná-lo o objeto de desejo mais cobiçado do mundo, não servir para absolutamente nada.
Passados os anos, o mercado já saturado de tantos objetos de fazer nada, os “iNadaNews” como ficaram mundialmente conhecidos, o departamento de Publicidade é outra vez convocado às pressas para resolver uma nova e dramática questão: Como fazer para manter, ou mesmo incrementar, o volume de vendas do produto.
Eles sorriram e disseram: “Ora, Isso é muito simples. Agora vamos adicionar qualquer coisa ao aparelho e anunciar que se trata de um grande avanço; uma renovação nunca antes vista pelo homem, daquilo que já era novo. Por exemplo, vamos acrescentar ao aparelho de fazer nada, botões coloridos que também não fazem nada, e pode ter certeza de uma coisa, o sucesso será ainda maior que o modelo original...”
E foi mesmo...
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Alberto Grimm - albertogrimm@gmail.com
É Antropólogo, Publicitário e Escritor especializado em educação Iintegral. Os Contos Curiosos são fábulas modernas, das quais sempre podemos extrair formidáveis lições de vida, que muito favorecem à reflexão.
O autor não possui Website, Blog ou página pessoal em nenhuma Rede Social.
Confira outras publicações do autor em:
Mundo Simples - Contos Curiosos
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Alberto Filho - albfilho@gmail.com
É orientador e Consultor em educação infantil e adulta, inclusive da terceira idade, com especialização em Educação Integral e Holística. É também tradutor, Ilustrador, escritor de contos infantis e adultos.
O autor não possui Website ou Blog pessoal.
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