Autor: Alberto Filho[1]
Conteúdo Atualizado: 15 de Julho de 2024
Se dentro de cada mesologia, cultura nacionalista ou étnica há uma ideologia, fórmula ou cartilha que estabelece as regras e preceitos da ética localmente aceita como válida, isto equivale dizer que a contextualização desse status vai depender do modo como aquela cultura interpreta e conceitua o Errado e o Certo.
Afinal de contas, a despeito da existência de um conceito de Ética Universal, naquele caso, localmente, a autoridade que ajuíza o que é errado ou certo é que dará a palavra final. Mas, e qual é a Autoridade que autentica ou autoriza esse Juiz a atribuir e homologar tudo aquilo que ali é moralmente Correto, e imoralmente Errado, ou segundo ele, Consciencialmente Ético?
Em outras palavras, a definição daquilo que é moralmente correto é instituído, protocolado e decretado por quem? E qual será a autoridade ou instância encarregada de certificar que os desígnios do sentenciador ou juiz estão de fato pautados na verdade?
Para os fabricantes das drogas alcoólicas, a despeito dos milhares de "clientes", ou vítimas, que morrerão afogados pela embriaguez dos seus compostos etílicos, assim como das famílias que serão destroçadas pelo mesmo motivo, o conceito de ética se resume a pagar seus impostos em dia e depois gratificar, de acordo com as leis trabalhistas em vigor, todos os seus empregados ou cúmplices.
E para cada um daqueles funcionários dedicados à produção e disseminação daquela droga tóxica retoricamente chamada de produto interno bruto, praticar ética significa apenas respeitar as leis do seu país e depois se curvar em sinal de humildade diante dos deuses, ou ícones que dão lastro a sua tradição cultural, ideologia ou crença religiosa local.
Então surge o mito – na verdade trata-se de senso comum entre todos – de que uma ação isolada, necessariamente, também terá como desdobramento um efeito isolado. É algo como se, por exemplo, ao ferirmos alguém com palavras ou atos, um posterior pedido de desculpas fosse capaz de reparar as consequências criadas a partir do primeiro gesto. Segundo este ponto de vista, não se leva em conta o efeito da agressão e seus desdobramentos, consequências e prejuízos, imediatos e posteriores, mas apenas o segundo ato, que é o pedido de desculpas.
Ocorre que, um processo de agressão, seja ele físico ou verbal, nunca terá como efeito apenas um resultado ou consequência isolada capaz de afetar apenas a vítima. Não vivemos reclusos em retiros ou clausuras, nossos interrelacionamentos é a essência da vida em sociedade. Assim, a ferida é sempre coletiva.
A qualidade da saúde mental da vítima interfere dramaticamente em seus atos e em suas relações pessoais. Logo, os mais próximos da vítima, ou aqueles que façam parte do seu grupo de convívio mais íntimo, independente do agressor ter ou não consciência disso, também serão vítimas em primeiro grau da mesma injúria.
Se há uma lei de Causa e Efeito, logo, este ato, terá se desdobrado em dezenas, talvez centenas, de eventos impossíveis de serem mensurados. Não se trata mais de um efeito a partir de uma causa, mas de infinitos efeitos a partir de uma mesma causa inicial.
Tabular as consequências que virão a partir do desdobramento daquela ação inicial, é, portanto, algo impossível de ser feito. Isto significa dizer que, uma suposta boa ação, não anula os efeitos de outra má. São coisas distintas, de naturezas opostas. Além disso, cada uma seguirá um caminho peculiar, criando em seu rastro outros tantos desdobramentos, e tudo isso de acordo com sua natureza original.
O pior de tudo é que vivemos em um mundo doente, onde os efeitos negativos tendem a ganhar mais destaque e visibilidade. Isto significa dizer que irão se propagar em maior velocidade que os positivos. A fórmula desta métrica é bastante simples: num ambiente contaminado pela negatividade, a força de empuxo para compartilhar um problema compatível com sua natureza nosográfica é maior do que o seu inverso.
Assim, perceber em si mesmo, identificar uma contradição ou traço negativo passível de causar malefícios, isto equivale à descoberta de uma virtude que será acrescentada ao nosso tesouro pessoal. Agora, ciente deste gargalo, ao impedirmos que aquela anomalia comportamental ou defeito de personalidade, de nossa parte, se transforme em uma má ação, este já é um gesto virtuoso.
Entender por que aquele atributo negativo ainda faz parte do nosso comportamento e erradicar suas causas, isso implica em liberdade, uma vez que, pelo menos a partir de nós, ele nunca mais causará dano algum ao mundo.
No entanto, uma descoberta dessa natureza ainda não faz parte das resoluções da maioria das pessoas. Consensualmente, todos ainda acreditam que a transformação pessoal ocorre de fora para dentro, e não de dentro a partir da constatação do que existe lá fora. Por isso esperam diligentemente que a mão mágica de um Guru espiritual ou crença religiosa atue como patrocinador desta mudança.
O homem comum ainda não é capaz de enxergar ou compreender, pelo menos não dá indícios disso, de que para todo efeito experimentado há sempre uma causa previamente semeada.
Mas, por que será que ele ainda se mostra incapaz de entender isso com a devida clareza, ou lucidez?
Em primeiro lugar, porque faz a si mesmo muitas concessões, e assim acaba se isentando dos males que pratica, sempre atribuindo a outros todos efeitos dos seus atos. Além de tudo isso, caso não perceba imediatamente os efeitos dos seus atos, sejam negativos ou positivos, tende a ignorar todo resto. Assim, ele acaba agindo de uma maneira onde, só é capaz de perceber um ferimento em seu dedo, caso haja um sangramento no ato.
Eis o motivo pelo qual não se dá conta de como tem plantado ao longo de sua existência dezenas de sementes que mais tarde se transformarão em frutos imprestáveis ou deformados. Uma coisa é certa: Se estivesse consciente de tudo isso, estes frutos certamente teriam outro status. Seriam frutos com uma qualidade compatível com o cuidado e zelo que teria o produtor de uma horta bem cuidada, e não os frutos de uma qualidade desprezível como o seriam aqueles produzidos a partir de uma horta mal cuidada.