Adaptação e Revisão: Alberto Filho[1]
Conteúdo Revisto e Atualizado: 17 de Maio de 2024
"Para se compreender a verdadeira natureza de uma crinça ou jovem, ter apenas boa intenção nunca será suficiente..."
A mãe de Paulinho sabe que todas as coisas têm uma razão de ser, que nada acontece por mero acaso, que é preciso primeiro conhecer a origem, os antecedentes de um comportamento patológico, caso se pretende compreendê-lo.
Mas ela não consegue entender o filho, não sabe a que atribuir o negativismo, a atitude anti-social. Paulinho é criança que não confia em ninguém, nem tampouco manifesta espírito de colaboração ou solidariedade. Embora não haja motivo aparente para seu retraimento exagerado, nada enfim que se justifique, aos olhos da mãe, o menino é arredio, cauteloso, como se crianças e adultos só se aproximassem dele para causar-lhe prejuízo, difamá-lo, maltratá-lo.
É natural que a mãe se aflija e que demonstre suas preocupações ao ver que o filho tudo faz para tornar-se desagradável, antipático. Então ela não sabe que uma pessoa em tais condições é incapaz de ligar-se efetivamente a outras e de participar da experiência de um grupo? Como esperar que seu filho venha um dia a ser feliz, a viver e trabalhar de maneira construtiva em benefício próprio dos outros?
O que essa mãe não sabe é que talvez nunca possa reconhecer e aceitar, porque tremendamente doloroso, é o fato de ser ela própria a primeira e a principal responsável pelo drama que hoje tanto a aflige. Sem querer prejudicar o filho, naturalmente, e sem saber o que fazia, a mãe exerceu sobre ele, desde os primeiros meses de vida, a pior das influências: ensinou-o a ter medo das pessoas.
Quem conheceu o menino desde os 6 meses de idade viu que criança risonha, que criança dada, ele foi, terá de se surpreender com a transformação de agora. Mas quem conheceu a mãe e observou no modo pelo qual ela tratava o filho, sempre que alguém – estranho ou mesmo da família – dele se aproximava, não terá surpresa; compreenderá facilmente que a Timidez, esse absurdo "medo neurótico de gente", que a criança patologicamente hoje manifesta, é uma conseqüência natural, lógica, da atitude da mãe, desde que a criança nasceu.
Sempre que alguém chegava perto da criança, sorrindo-lhe, estendendo-lhe os braços na evidente intenção de segurá-lo, a mãe reagia contra: pressionava seu corpinho de leve, atraindo-o para si, no instintivo desejo de retê-lo. Assim, sem palavras, prevenia e alertava o filho contra perigos imaginários. Era como se ela lhe falasse claramente: "cuidado, não vá com fulano, desconfie, meu filho, só eu gosto de você, só eu sou capaz de lhe proteger..."
Quando ela recebia visitas ou estava em viagem, procurava sempre defender o filho do olhar ou do carinho das outras pessoas, sentando-o de costas para elas. À medida que Paulinho começou a falar e a andar, a mãe alertava-o também verbalmente: não confie em ninguém, só quem gosta você é sua mãe. É natural que tudo isso tenha sido captado, sentido e magistralmente assimilado.
Primeiro a linguagem do gesto e depois o reforço da palavra consolidaram o mesmo conceito: Todas as pessoas – com exceção de sua mãe – são perigosas.
Assim aos poucos, dia após dia, durante meses e anos, Paulinho finalmente aprendeu a lição do medo. Diante de cada rosto sorridente ou aceno afetuoso ele acostumou-se a pressentir uma iminente ameaça, traição, o perigo evidente.
Desenvolveu gradativamente o instintivo sentimento de defesa que o bloqueou emocionalmente e que hoje – em forma de retraimento ou timidez – anulou sua espontaneidade, impedindo-o de relacionar-se; de conviver normalmente com outros seres humanos.