Autor: Jon Talber[1]
Conteúdo Atualizado: 16 de Julho de 2024
Observação Importante: Quando usamos a Expressão "O Homem, ou os Homens", estamos nos referindo aos dois Gêneros, e não apenas ao Gênero Masculino.
Parece inevitável, uma vez que aparentemente trata-se de uma reação, à primeira vista involuntária, e lá estamos procurando nos outros um modelo de Perfeição cuja forma e aparência nem nossa mais criativa imaginação é capaz de conceber.
Não sabemos o que é a Perfeição, mas fomos treinados desde o berço para buscá-la em qualquer coisa que esteja ao alcance dos nossos sentidos e atos. Para nós perfeito significa superior, melhor em desempenho, estética e qualidade. Segundo os critérios sociais, que também são os nossos, deverá ser algo nunca sujeito a falhas. É o ideal imaculado ou obra divina, que embora não sejamos capazes de descrever ou detalhar, faz parte do imaginário popular, dos nossos sonhos, imaginação, devaneios e delírios mais profundos.
Na verdade, o que queremos são respostas, preferencialmente as prontas. Respostas dúbias não nos interessam, uma vez que suscitam a reflexão, estudo e ponderação, e como pensar com lucidez dá trabalho, preferimos evitar.
Tampouco serão bem vindas aquelas soluções incompletas, opções que exijam de nossa parte algum tipo de esforço complementar. Por isso valorizamos os roteiros, receitas ou tutoriais prontos, cujo uso já foi socialmente protocolado como regras válidas, ou fórmulas com potencial para modificar nossa conduta ou destino como num passe de mágica.
Buscamos palavras ou atos miraculosos que nos induzam mudanças imediatas, e o mais importante, sem esforço algum de nossa parte, e este é o ideal de solução acolhido pelo nosso imaginário. Tirar conclusões a partir de reflexões pessoais profundas ou por meio de mudanças em nossos hábitos, isso, definitivamente, não faz parte de nossas resoluções existenciais. Razão pela qual buscamos os conselhos dos especialistas, gurus, sábios, santos, ministros religiosos, guias ou livros sagrados. Basta que nos digam onde encontrar a resposta pronta e lá estaremos. Eis o principal motivo que fez da arte do copiar e colar comportamentos nossa mais importante conquista cognitiva de todos os tempos.
Uma alegria é sempre um evento de curta duração, portanto, uma alegria imperfeita. Perfeita seria a alegria perpétua, ou segundo nosso imaginário, um contentamento que gradualmente se ampliaria até atingir seu ponto máximo. Este ápice ou ponto de chegada seria a condição perfeita. Difícil, porém, é determinar onde está situada esta linha de chegada, ou ainda qual seria a forma deste modelo de perfeição definitivo. Motivo pelo qual, aqueles que supostamente já sabem, a exemplo dos homens sábios e gurus, para nós, se tornaram símbolos tão importantes.
De fato, já começamos nossa busca com um repertório considerável de respostas. Em nossas memórias ou banco de lembranças há sempre um roteiro detalhado de cada objetivo que devemos conquistar. E em todos há a promessa de um estado de perfeição exclusivamente destinado aos humanos; uma condição possível de ser comprada com algumas penitências, rituais sacros, sacrifícios pessoais, ou até mesmo em troca de ações assistenciais.
Em nossos relacionamentos idealizamos a imagem de uma companhia perfeita, impecável, não mais sujeita a retoques ou ajustes. Seria aquele protótipo único, detentor de todas as qualidades e virtudes possíveis e impossíveis de ilustrar um ser humano; uma entidade superior, acima de todas as expectativas, anos luz a frente de todos os demais mortais. A mesma regra se aplica às nossas aquisições materiais, ideias ou ideais, padrões étnicos e estéticos, sistemas de crenças, e assim por diante.
Quando buscamos a perfeição, mesmo sem saber do que se trata, também estamos nos colocando no topo da pirâmide do saber. Afinal de contas, agora nos autodelegamos como juízes encarregados de decretar e fixar os critérios, parâmetros e gabaritos capazes de autenticar a coisa que deverá ser categorizada, eleita, sacramentada como perfeita.
Mas o ente humano não é perfeito, está muito longe disso. E embora seja uma extraordinária máquina biológica, ainda apresenta inúmeras falhas. Está sujeito ao desgaste, definha, adoece e morre. Sua mente se degrada e seus pensamentos criam coisas inexistentes, ambíguas. Deformam, adulteram, acrescentam, é contraditório e tem na imitação irracional sua mais importante pedagogia.
Por isso seus princípios ou critérios de escolhas são duvidosos, parciais, equivocados. Traça seus juízos opiniões ou verdades abstratas e caóticas, a partir de uma tradição patológica dotada de pouca ou nenhuma lógica. São juízos dogmáticos, ideológicos ou religiosos; axiomas bizarros que por uma questão de hábitos tirados de costumes milenares da tradição, ou ainda de tabus ou preceitos sacros, nunca poderão ser contestados.
Seria possível uma máquina defeituosa produzir uma peça perfeita? Se estamos sempre em busca do mais é porque temos de menos. Se ao mais sempre há espaço para acrescentar alguma coisa, isso ocorre simplesmente porque aquilo que julgávamos perfeito ainda está incompleto. A necessidade de corrigir, reparar ou eventualmente acrescentar um algo mais à obra é uma evidência incontestável de sua imperfeição ou incompletude.
Imagine se ao perfeito é possível acrescentar mais alguma coisa. Sendo possível o acréscimo, é porque não é perfeito; ainda não está concluído, talvez nunca esteja. Assim, a perfeição que buscamos é um mito, uma fantasia criada por uma mente doente, nada mais que um delírio ilusório; um desígnio típico de um intelecto concebido para enxergar na fantasia dos delírios pessoais um propósito existencial válido.
No entanto, aceitar a imperfeição não é algo tão simples para um Ego que foi doutrinado desde a infância para exercer o papel de uma entidade superior, concebida à imagem e semelhança do próprio criador do Universo. Caso viesse a aceitar sua condição de imperfeito, talvez o homem fosse capaz de se tornar mais tolerante, humilde, e decerto iria rever todos os seus critérios de julgamento em relação aos outros homens.
Aceitando sem ressalvas a imperfeição pessoal, poderíamos nos tornar capazes de enxergar diante de nós indivíduos semelhantes, e com uma coisa em comum, a necessidade de reciclagem. Não mais estaríamos em busca de uma Galinha com os Ovos de Ouro. Teríamos então consciência de que estamos vivendo um momento transitório, onde as mudanças, evidências incontestáveis nossas imperfeições, irão ocorrer, com ou sem a nossa concordância.
A maioria dos conflitos humanos está centrada na ideia da impecabilidade absoluta. Certificados de nossa imperfeição, cláusula comum a todos, não mais criaríamos falsas expectativas em relação a quem quer que seja; fosse pessoa comum, uma autoridade mundana, um santo, ou mesmo um sábio autoproclamado como guia da humanidade.
Os homens santos ou os guias espirituais também foram eleitos pelos nossos critérios, juízos equivocados, pensamentos imperfeitos e contraditórios. A impecabilidade que enxergamos nos sábios é apenas um simples reflexo de nossas próprias aspirações; o resultado de um pensamento confuso patrocinado por uma tradição pautada nos absurdos, um compêndio pedagógico equivocado anterior a nossa própria existência.
As palavras nunca serão as coisas que tentam rotular. A palavra “perfeito” não passa de uma alegoria; uma representação simbólica de um estado transitório, ou condição temporária, de alguma coisa, nada além disso. Perfeito é o fato de que os ciclos regentes de tudo que existe são autônomos, isto é, não foram criados por nós; muito menos são dependentes de nossa presença, caprichos, crenças e quaisquer outras deliberações humanas.
E embora existam os ciclos da natureza, a verdade é que desconhecemos na íntegra sua origem ou motivos. Mas eles atuam assim mesmo, sem nossa interferência, sem nosso consentimento ou concordância. Perfeito são os ciclos; imperfeitos todos os objetos sujeitos às leis inflexíveis destes ciclos.
E assim rotulamos o mínimo com a palavra que, segundo nossos juízos, é a mais adequada para representar o máximo. Para nós uma coisa bem feita, apenas reflete que aquilo é capaz de atender aos nossos anseios, expectativas, demandas somáticas ou necessidades temporárias. Outros usarão medidas diversas para aferir uma mesma coisa, e assim o julgamento não passa de uma condição relativa aos olhos de cada juiz.
Se a opinião de muitos sobre uma mesma coisa é divergente, a verdade absoluta não está sob jugo de ninguém, nem mesmo daquele que se julga o mais sábio dos homens. Para aquele que se intula o mais sábio, há sempre outro que se julga ainda mais, e outro, e assim continuará numa corrente de disputa sem fim. Logo, perfeita é exatamente a condição de imperfeição, um status que evolutivamente coloca, ou deveria colocar, a todos numa mesma condição de igualdade.